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No Brasil da cloroquina, faltam 21 remédios para pacientes com covid-19 nas UTIs

Ministério da Saúde admite desabastecimento de medicamentos sedativos para entubar infectados pelo novo coronavírus nos Estados e anuncia estratégia para mitigar o problema

No mesmo Brasil que se realizou uma verdadeira força-tarefa para garantir que não faltasse cloroquina no tratamento precoce de pacientes com o novo coronavírus antes mesmo de o medicamento ter sua eficácia comprovada, faltam remédios para sedar e entubar os pacientes mais graves com a covid-19 nas UTIs. Há semanas, secretários municipais e estaduais da saúde levam essa demanda ao Ministério da Saúde.

Apresentaram uma lista de 21 medicamentos que integram seus protocolos e que prefeitos e governadores não têm conseguido comprar. Uma resposta mais efetiva do Ministério da Saúde sobre o problema foi apresentada nesta segunda-feira (29): um acordo com a OPAS para importar parte dos medicamentos, um novo edital de licitação para aquisição e a requisição do que ainda não havia sido vendido em contratos pelas farmacêuticas. Ainda assim, o Governo não tem como garantir que conseguirá suprir a demanda de remédios pelo período de sete dias reclamada pelos Estados, quando o Brasil já soma mais de 1,3 milhão de infectados, 552.000 deles hospitalizados.

“Não atende de imediato essa necessidade de sete dias, mas já é uma resposta”, diz a diretora do Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos da pasta, Sandra de Castro Barros. Esses medicamentos são usados nos protocolos de hospitais públicos para sedar e manter estáveis pacientes acometidos de forma grave pela covid-19 e que precisaram ser entubados. A demanda por eles têm crescido durante a epidemia, que tem elevado tanto o volume de pacientes nas UTIs quanto o tempo de permanência deles ali, aumentando também a quantidade de medicamentos utilizados. Isso provocou um aumento da busca por esses remédios, cujos preços explodiram. As variações do dólar durante a pandemia também contribuíram para a dificuldade dos Estados em conseguir comprar os medicamentos, explica o Ministério da Saúde. A pasta ―que também diz que o setor farmacêutico não está tendo problemas para importar os insumos nem produzir os remédios― começa a intervir para mitigar o problema que pode cobrar a vida de brasileiros.

Questionado sobre quais Estados estão numa situação mais crítica em relação aos medicamentos que têm hoje no estoque, o Ministério da Saúde disse apenas que, de uma maneira geral, todos “precisam de alguma coisa para complementar seus protocolos” ―ou seja, necessitam de itens para o tratamento que utilizam em pacientes com o novo coronavírus. “Essa demanda tem uma velocidade muito grande e existe grande flutuação de estoques entre os Estados. Se a gente for dizer que um precisa menos que o outro, não estaremos sendo justos”, afirma Sandra de Castro.

O Conselho Nacional de Secretários Estaduais da Saúde (Conass) elaborou um documento com a situação enfrentada pelos Estados. Nele, mostra por quantos dias ainda existem medicamentos no estoque de remédios usados nas UTIs para a covid-19 por unidade da federação. O documento leva em conta todos os hospitais públicos, sejam eles geridos pelos Estados ou por municípios. No dia 24 de junho, 14 Estados não tinham um medicamento chamado Besilato de Cisatracúrio (indicado para ser utilizado durante procedimentos na terapia intensiva), por exemplo, para mais nenhum dia de tratamento. Mas a lista é mais longa. O documento traz uma lista de ao menos 21 remédios com problemas para compra ―alguns faltam mais em determinados locais e outros menos.

O problema vem de um “desajuste no mercado”, diz o secretário executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco. Segundo ele, o Governo se reuniu com farmacêuticas e não identificou problemas para produzir os medicamentos. Ainda assim, por questões logísticas e pela elevação de preço diante da alta demanda viraram empecilhos para a compra que é atribuição dos Estados e municípios. Franco diz que os medicamentos para entubação dos pacientes graves são importantes, mas destaca que o Governo tem orientado terapia de oxigenação não invasiva e um protocolo de medicamentos no início dos sintomas (que inclui a cloroquina) para evitar que os pacientes evoluam para uma manifestação grave da doença e precisem da internação na UTI.

Desde o início da crise, o Governo brasileiro concentra energia para garantir a cloroquina no tratamento de pacientes com a covid-19. O presidente Jair Bolsonaro tem sido um grande defensor do medicamento, mesmo quando ainda não há estudos conclusivos sobre a eficácia da cloroquina para tratar a covid-19. Dois ministros da Saúde desembarcaram do Governo por conta de divergências com o presidente.

O Exército aumentou em 80 vezes a produção da cloroquina durante a crise. O ministro interino da Saúde, general Eduardo Pazuello, publicou um novo protocolo para que esse remédio ―muito utilizado no Brasil para tratar malária― passasse a ser usado já nos sintomas iniciais da doença. Mais recentemente, o Ministério da Saúde o ampliou para ser aplicado em grávidas e crianças com a covid-19. Foi nesse contexto que o Governo chegou à marca de 4.374.000 comprimidos de cloroquina distribuídos em todo o país durante a crise.

Questionado se o Governo não errou ao focar na distribuição de um medicamento sem eficácia comprovada em vez de gastar energia para garantir que não faltassem medicamentos para entubação de pacientes mais graves com o novo coronavírus, Élcio Franco defendeu o uso da cloroquina para evitar que os infectados tenham seus casos agravados. Disse que há estudos que mostram bons resultados, mas não citou concretamente nenhum deles, e afirmou que a Índia tem mostrado resultados positivos com o seu uso associado a outros medicamentos. “O que se busca é apenas preservar a autonomia do médico em prescrever conforme sua análise clínica”, diz. O secretário executivo ainda afirmou que é comum uma ação como essa em tempos de pandemia e que evidências mais robustas devem sair em breve, provavelmente daqui a um ano. Sobre a falta de medicamentos para entubação, Franco disse que o desabastecimento foi causado pelo aumento do custo diante da alta procura e defendeu que o Governo não se omitiu de suas responsabilidades.

A técnica Sandra de Castro, por sua vez, defendeu que o Governo não deixou de comprar os medicamentos usados na UTI em detrimento da cloroquina. Segundo ela, a compra dos remédios de uso hospitalar, como os para entubação, não é centralizada no ministério. Ela explica que as fontes dos recursos são diferentes e que a falta de medicamentos é por conta do aumento da demanda, que encareceu esses produtos. “Já adotamos estratégias. Não vamos causar nenhum prejuízo também à parte privada do sistema de saúde do Brasil”, disse.

 

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